As frutas desenvolvidas por startups, anunciadas como soluções inovadoras para problemas como mudanças climáticas, valor nutricional e sabor, representam um exemplo claro de como o consumo e a lógica mercadológica têm moldado até mesmo o que comemos.
Embora a promessa dessas “frutas do futuro” soe atrativa, é importante refletir sobre o quanto essa narrativa serve aos interesses comerciais em vez de responder às necessidades reais dos consumidores.
A Agrovision Corp., por exemplo, conquistou um mercado bilionário com seus mirtilos “grandes e crocantes”. Mas será que o tamanho e a crocância são demandas genuínas ou apenas mais uma forma de atrair consumidores com produtos super idealizados?
A criação de uma fruta sem sementes é um suposto “avanço” tecnológico que, no fundo, pode ser vista como mais um exemplo de como o design do produto é guiado por demandas artificiais criadas pelo marketing, em vez de atender questões prioritárias, como acessibilidade e sustentabilidade.
Outro exemplo é o pequeno abacaxi da Fresh Del Monte, apresentado como uma solução para reduzir o desperdício de alimentos.
Embora o argumento pareça razoável, a questão central permanece: o problema do desperdício seria melhor resolvido por ajustes na distribuição e no consumo, em vez de reformular o tamanho das frutas? Aqui, a narrativa de eficiência serve mais como uma justificativa para novas vendas do que como uma transformação efetiva no sistema alimentar.
E então há os morangos de luxo da Oishii, que conquistaram um espaço no mercado com preços inacessíveis para a maioria das pessoas.
O apelo aqui é óbvio: exclusividade, qualidade e status. Porém, o que está sendo vendido não é apenas a fruta, mas também a ideia de que o luxo e a “inovação” são inseparáveis, mesmo em algo tão básico quanto um morango.
Por fim, essas novas frutas não são apenas alimentos. Na matemática mercadológica, elas representam uma visão de mundo onde a “inovação” é tratada como solução universal, mesmo quando os problemas que ela pretende resolver poderiam ser encarados de forma muito mais simples, por exemplo:
A valorização práticas agrícolas locais e tradicionais, que não dependem de transformações genéticas ou grandes campanhas de marketing, e que podem atender a uma gama maior de pessoas de maneira justa e equilibrada.
Ou seja, a produção convencional — ou agroecológica, dependendo da abordagem — continua sendo uma alternativa mais acessível e sustentável.
Questões para refletir: Será que precisamos mesmo de abacaxis menores ou cerejas sem sementes? Ou será que estamos apenas consumindo o que nos é vendido como essencial?
Talvez a verdadeira inovação esteja em resgatar práticas sustentáveis e uma relação mais honesta com o que colocamos à mesa.